Dr. Christopher Kaczor
Word on fire, 4 de fevereiro de 2025    

Emma Camp disse: “Quando estou num dia bom, só acredito em Deus cerca de 30 por cento do tempo”. O historiador Tom Holland coloca esta questão do seguinte modo: “Por vezes consigo sentir - consigo acreditar - que o Espírito é real. Posso acreditar que a história da Paixão e da Ressurreição é tão estranha que não pode ser fruto de um mero acidente cultural, mas que exprime o que é verdadeiro. E há outras alturas em que penso: 'Não, tudo isto é um completo disparate'”.  

Eu entendo o que eles sentem. De facto, por vezes sinto que é óbvio que Deus não existe. Neste ponto, não estou sozinho. Na obra clássica “Mere Cristianity”, C.S. Lewis redigiu uma ideia semelhante: “Agora que sou cristão, tenho momentos em que tudo parece muito improvável: mas quando era ateu, tinha momentos em que o cristianismo parecia muito provável”. Será que as minhas mudanças de humor significam que passo de crente a ateu e vice-versa, por vezes mais do que uma vez no decurso do mesmo dia?  

De modo algum. Simplesmente, Fé e sentimento não são a mesma coisa. Como observou Lewis: “A Fé, no sentido em que estou a usar a palavra, é a arte de nos agarrarmos a coisas que a nossa razão aceitou, apesar das nossas mudanças de humor. Porque os estados de espírito mudam, seja qual for o ponto de vista da sua razão. Sei-o por experiência própria”. O grande filósofo Alexander Pruss colocou a questão da seguinte forma:

“Por vezes, os cristãos interrogam-se se não teriam perdido a fé? . . . Sendo a fé um dom da graça, não é possível perder a fé sem perder a graça santificante. Mas não é possível perder a graça santificante a não ser cometendo um pecado mortal. Portanto, só se pode perder a fé cometendo um pecado mortal. Mas num cristão conscencioso, é muito pouco provável que o pecado mortal seja algo feito casualmente - afinal, é uma rejeição livre e consciente do amor de Deus. A fé não é, portanto, algo que se possa “simplesmente perder”. É algo que se pode rejeitar, mas apenas através de um pecado mortal. 
A Fé é uma virtude teológica que se recebe no momento do batismo. Se foi batizado, recebeu o dom da Fé. Este dom não é de modo algum revogado pelas mudanças de humor do momento”.   

Simplesmente, fé e sentimento não são a mesma coisa    

Assim, a Fé é algo como o casamento. Depois da boda, estamos efectivamente casados, independentemente do que possamos sentir num determinado momento, em relação ao nosso cônjuge ou ao facto de estarmos casados. Os estados de espírito não alteram a realidade do casamento. Do mesmo modo, quando se é batizado, recebe-se o dom da fé e a pessoa torna-se um filho adotivo de Deus. Este dom da adoção mantém-se independentemente do que possa sentir em acerca de Deus ou da sua relação com Ele. 

Se os seus sentimentos oscilam como os meus, não tenha medo. O estado de espírito que temos num determinado momento é influenciado por múltiplos factores totalmente fora do nosso controlo: como dormimos na noite passada, se o jantar perturbou a nossa digestão, se o sol brilha ou se a chuva cai. Ora a Fé não depende de nenhuma destas coisas passageiras.  

A Fé também pode ser comparada à vida física. Não nos demos a nós próprios vida que temos. Recebemos a vida dos nossos pais e de Deus. Agora que estamos vivos, podemos cuidar da vida que nos foi dada e protegê-la de qualquer dano, independentemente dos nossos sentimentos actuais. Precisamos de alimentar o nosso corpo para que ele sobreviva e se desenvolva; da mesma forma, precisamos de alimentar a nossa fé para que ela sobreviva e se desenvolva. Quando nos sentimos ateus, podemos seguir o exemplo de C.S. Lewis, que escreveu 
“A fé é uma virtude tão necessária: se não pusermos os nossos apetites na ordem, nunca seremos bons cristãoes, ou sequer ateus a sério; seremos criaturas sem tino, que se deixam levar, e cujas convicções são determinadas pelo estado do tempo e o lado para o qual acordaram nesse dia.”   

E como é que treinamos este hábito de fé? Lewis continua, 
O primeiro passo é reconhecer o facto de que os nossos estados de espírito mudam. O passo seguinte é certificar-se de que, se uma vez que aderiu ao cristianismo, alguns dos seus principais principios devem ser deliberadamente guardados na sua mente todos os dias, durante algum tempo. É por isso que as orações diárias, as leituras de livros de espiritualidade e a ida à igreja são hábitos necessários da vida cristã. Temos de ser continuamente recordados daquilo em que acreditamos. Nem esta convicção, nem qualquer outra, permanecerá de forma constante na mente sem ser alimentada. 

Tal como uma relação conjugal precisa de uma boa comunicação para florescer, a fé em Deus precisa de oração e estudo para frutificar. Por isso, não devemos deixar que a mudança de sentimentos perturbe a nossa fé. Como disse o Pe. Richard John Neuhaus, outro convertido: “Se queres acreditar, age como se acreditasses, deixando a Deus a tarefa de saber se acreditas, pois esse pôr-se nas mãos de Deus é a Fé”.    

Tradução livre de

Maria do Rosário H. Mc kinney