O lugar da Beleza na Catequese
10 de agosto de 2024

Billy Swan*    

O lugar da beleza na catequese recebeu um impulso oportuno em 2013 com a publicação pelo Papa Francisco de “A Alegria do Evangelho”. Enquanto os papas anteriores, como São João Paulo II e Bento XVI, exortaram os cristãos a estarem atentos às "epifanias da beleza" e se referiram aos artistas como "guardiães da beleza", o Papa Francisco foi mais longe ao colocar a beleza ao serviço da catequese e da transmissão da fé:  

- A alegria do Evangelho, 167**

É bom que toda a catequese preste uma especial atenção à «via da beleza (via pulchritudinis)» .  . Toda a expressão de verdadeira beleza pode ser reconhecida como um caminho que conduz ao encontro com o Senhor Jesus. . . . Por isso, uma formação na via pulchritudinis deve fazer parte do nosso esforço para transmitir a fé. (A Alegria do Evangelho, 167)  

Aqui eu exploro  a forma como as expressões de beleza na criação, na música, na arte e na vida dos santos são oportunidades para encontrar Cristo e acompanhar os outros na Fé.  

A Beleza na Criação  

"Os céus proclamam a glória de Deus", exclama o salmista ao contemplar a beleza dos céus que reflectem a beleza do Criador (Sal 19,1). A contemplação da criação dirige o nosso olhar para fora, mais para cima, para o que Deus criou, e menos para baixo, para o que nós fizemos, de forma a  ver a beleza que muitas vezes nos escapa.   

Na altura em que este salmo foi composto, o que o autor conseguia ver estava limitado, era a olho nu. Hoje, com as capacidades do Telescópio Espacial de James Webb e as descobertas do Telescópio Hubble, não faltam novas epifanias de beleza com que a alma humana se pode deleitar.   

A ciência em vez de ser uma ameaça à fé, é uma fonte inestimável de contemplação da Obra de Deus que nos leva de volta a Ele. Quer se trate do estudo dos planetas, das estrelas ou do micro-mundo da biologia celular, estamos continuamente a descobrir novas verdades sobre a criação, a sua beleza e a ordem que a caracteriza. São estas expressões de beleza que nos aproximam da fé, da fonte da Beleza  que é o próprio Deus.  

A Beleza na música  

A música bonita tem o poder de tocar o coração e de alcançar a alma. Nas palavras de São João Henrique Newman, a beleza musical representa "as manifestações da harmonia eterna no meio do som criado". Durante séculos, a Igreja tem sido a promotora da música litúrgica que conduz ao culto correto a Deus. A música tem captado maravilhosamente os Salmos e outros textos das Escrituras em inúmeros hinos e cânticos, proclamando a Palavra de Deus de forma criativa e eficaz.   

Acompanhar as pessoas pelo caminho da música bela é uma oportunidade de apresentar o Evangelho na linguagem da sintonia, da harmonia e da combinação de vozes e vidas na Igreja. O Espírito de Cristo coloca-nos de novo em sintonia e no comprimento de onda de Deus. Poderíamos dizer que era este o objetivo das parábolas e dos ensinamentos de Jesus. Ele convidava o seu público, através dos tempos, a sintonizar a uma nova frequência, a uma nova sabedoria, a uma nova compreensão, a uma nova lógica de amor e misericórdia.  

Não faltam novas epifanias de beleza com que a alma humana se pode deleitar.   

Para nós, na família da Igreja, a metáfora da música fala também do testemunho coletivo que damos. Nas palavras de Santo Efrém, o Sírio, cada uma das nossas vidas pode ser descrita como "a cítara do Espírito Santo" que produz notas musicais . Cada uma dessas notas une-se na Igreja para produzir um hino belo a partir da harmonia desses sons. Sendo a Igreja uma espécie de coro, então a participação de cada um de nós é crucial. Tal como cada um de nós é chamado à santidade e à comunhão com os outros,  também cada um de nós é chamado a sintonizar de novo a sua vida com a vida de Deus, aumentando a beleza dos cânticos  que cantamos.  

A Beleza na arte  

A Igreja possui um tesouro de arte cuja beleza está à espera de ser descoberta. Estas obras não são apenas belas em si mesmas, mas servem para recontar a história evangélica da salvação, mediar este dádiva às gerações actuais. Comentamos aqui acerca dos maravilhosos mosaicos de Ravena, nos frescos de Giotto, Miguel Ângelo, Frei Angélico e nas obras-primas de Caravaggio e Rafael. As obras de muitos destes artistas não se limitam a comunicar a mensagem do Evangelho, mas mostram também como o espetador é um participante ativo no drama que a obra artística retrata. Entre os exemplos contam-se os frescos de Frei Angélico encontrados em São Marcos, em Florença, que apresentam um frade dominicano pintado na cena do Evangelho. O espetador visado era um confrade que foi convidado a ver-se envolvido no drama da cena retratada.   

A Beleza da Santidade 

O Livro do Apocalipse descreve a beleza da nova Jerusalém: " E a cidade não necessita de sol nem de lua, para que nela resplandeçam, porque a glória de Deus a tem iluminado, e o Cordeiro é a sua lâmpada.E as nações dos salvos andarão à sua luz; e os reis da terra trarão para ela a sua glória e honra” (Apocalipse 21:23-24). Esta luz de que fala a Escritura é a luz divina que irradia de uma comunidade de cristãos unidos a Cristo, "a luz do mundo". Esta luz são os santos cujas vidas mostram a beleza da santidade. A título de exemplo, é Maria, a Mãe do Redentor, conhecida como tota pulchra (toda bela), por causa da Graça de Deus, que embeleza a sua humanidade.   

"Somos obra de arte de Deus", declara S. Paulo aos Efésios (2, 10), descrevendo a progressiva conformidade da nossa natureza humana com a de Cristo, ícone perfeito da beleza humana, "a beleza de todas as coisas belas", como o descreve Santo Agostinho (Confissões 3, 6).  

Pensamos naqueles que partilharam a beleza de Cristo: S. Francisco de Assis, que se extasiava com a beleza do mundo natural, enquanto ele próprio vivia uma bonita vida de caridade e de solidariedade com os pobres. As irmãs de Santa Teresa de Ávila falavam do esplendor do seu rosto depois de receber a Eucaristia, enquanto que a beleza de uma consciência reta demonstrada pelos Santos João Fisher e Tomás More continua a ser um farol de luz para os líderes políticos e eclesiásticos de hoje.  

Em tempos mais recentes, o século XX produziu mais martírios pela fé do que todos os séculos anteriores juntos. Dessas vidas irradia a beleza da caridade, da coragem e do amor que dá a vida pelos outros, a exemplo do Mestre. O círio pascal que ilumina o bunker de fome em Auschwitz onde Maximiliano Kolbe morreu simboliza o seu supremo ato de misericórdia ao oferecer-se para tomar o lugar de outra pessoa condenada à morte. Ou o exemplo do Beato Carlo Acutis, o primeiro santo do milénio, cuja devoção à Eucaristia e testemunho de esperança perante a doença e a morte está a inspirar uma nova geração.

As vidas dos santos são janelas através das quais contemplamos a beleza de Deus que triunfa sobre todas as formas de fealdade, escuridão e desespero. Nas palavras de Dostoiévski, é a beleza que salvará o mundo. A luz destas vidas santas desperta o amor que todas as almas desejam, as vidas que "brilham, como as faíscas atravessam o restolho" (Sab 3,7). Contemplar a beleza das vidas santas aproxima-nos da mesma fé que as animou.  

Conclusão
Na visão do Papa Francisco, o papel dos evangelizadores e catequistas é fundamental para conduzir as pessoas pelo caminho da beleza que leva à Fé. Que toda a Igreja testemunhe a beleza de Deus, que irradia da criação, da música, da arte e da vida dos santos. Que nos tornemos a Igreja que Cristo quis - ser "Lumen Gentium" - mostrando a luz da beleza de Deus às nações. Que as pessoas vejam esta luz e sejam tocadas. E que elas venham a acreditar no Deus também da Beleza.    


Billy Swan
O Padre Billy Swan é um sacerdote da Diocese de Ferns, na Irlanda. É licenciado em química e trabalhou durante vários anos numa empresa farmacêutica antes de entrar para o seminário. Ordenado em 1998, serviu durante quatro anos como pároco associado antes de prosseguir os estudos em Roma, onde obteve a licenciatura e o doutoramento em Teologia Sistemática na Universidade Gregoriana. Trabalhou durante quatro anos como Diretor da Formação do Seminário no Pontifício Colégio Irlandês, em Roma. Atualmente, é responsável pela paróquia de Wexford, na Irlanda. Tem um profundo interesse pela relação entre fé e ciência, pela Nova Evangelização, pelo cristianismo irlandês primitivo e pela formação sacerdotal.    


Tradução livre de Maria do Rosário Homem Mc Kinney  

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* Artigo publicado em Word on  fire, site do Bispo Barron

** Exortação Apostólica EVANGELII GAUDIUM do Santo Padre Francisco